Linhas Extintas do RS

Trapiche na Villa do Conde, São Jerônimo. Manhã do dia 20 de abril de 2014.

O investimento ferroviário ao Sul do Jacuí veio anos depois do início da exploração das minas de carvão. A resistência governamental era decorrente da incerteza da qualidade do mineral. Em 1853, Sr. James Johnson, natural de Cornwall Inglaterra, recebeu do presidente da província a incumbência de sondar os pontos e qualidade do carvão gaúcho. A exploração aconteceu na Serra do Herval, atual Barão do Triunfo e o material foi carregado até São Jerônimo por "cargueiros (?)" e carretas, conforme relatos encontrados na Tese de Doutorado de Cristina Ennes da Silva. A concessão definitiva foi em 1866. Johnson pode contratar mão de obra de seus conterrâneos imigrantes visto que Brasil e Inglaterra mantinham laços comerciais. Este vínculo possibilitou inclusive a entrada de capital estrangeiro na estruturação da recém criada The Imperial Brazilian Collieries Co. Os objetivos iniciais diziam respeito a abastecer a indústria e navegação fluvial da província e a exploração se concentrou em Arroio dos Ratos.

A necessidade de um corredor de escoamento da produção fez com que iniciassem a instalação da ferrovia entre Minas dos Ratos e São Jerônimo. O impulso inicial foi dado mas o descaso do governo com a exploração do carvão ruiu a empresa de Johnson. Os investimentos em maquinários e na própria ferrovia endividou o empreendimento. Johnson foi destituído de suas funções ainda em 1873 e, diz-se, por conta das acusações que sofreu, faleceu logo em seguida. Em 1878 a Brazilian Collieries encerrou suas atividades.

O Ativo, quanto as dívidas da Brazilian Collieries foram absorvidas pela Holtzweissig e Cia. Esta teve vida curta porque o carvão importado estava com preço baixo e o investimentos britânicos na extração do carvão se ausentaram. Concluindo a fase imperial, o eixo cafeicultor São Paulo-Rio transfere recursos para o Sul e é fundada a Companhia de Minas de Carvão de Pedra de Arroio dos Ratos. Isto era o ano de 1883/84.

Após este rápido panorama de como começou a extração de carvão na metade sul, retornamos ao foco desta pesquisa: a via férrea. A princesa Isabel visitou a mina que levou seu nome, em 1885 e a sua chegada foi assim: Às 7 horas da manhã, partímos no vapor "Monarca" para Arroio dos Ratos para ver a mina de carvão.Passeio de rio muito bonito. Ao meio dia, pouco mais ou menos,chegávamos a São Jerônimo e Triunfo e desembarcávamos mais longe, onde começam os trilhos de ferro para a mina, vagões puxados primeiro por animais e depois locomotiva. Perdemos aí muito tempo.

Partindo deste fragmento, podemos identificar o ponto de partida da ferrovia quando diz "desembarcávamos mais longe". A seguinte foto, disponibilizada pelo Museu do Carvão, mostra o ponto de desembarque.

O terminal da Ferrovia coincidia com o Porto Pereira Cabral. A dificuldade em precisar o local é por conta das mudanças ocorridas no leito do rio desde 1885. Na foto acima, no canto superior direito se percebe a foz do Rio Taquari. Num panorama da direita para a esquerda, ilhas intercaladas. Semelhante a um delta. Comparando com as imagens atuais, temos uma discrepância porque a Ilha das Flores ocupa toda a paisagem adjacente ao canal.

Visto que na foto acima o horizonte se mostra em forma de delta de ilhas e não somente aparece a Ilha das Flores para supor que se tratasse das imediações da Usina Termoelétrica (se refere ao Conde. Em falando em Conde, o próprio Conde D'Eu fez este percurso. Não viria daí a origem do nome da villa?

No mesmo relato da princesa consta a transposição do Jacuí. "De novo do lado primitivo, está a estação da Estrada de Ferro, que passando por Taquari nos levou ao Rio Pardo, onde só chegamos às 9 e meia da noite." 

Chegamos em São Jerônimo já noite. Ficamos hospedados na casa de amigos. Neste percurso pelas cidades do carvão procuramos por marcos históricos que fundamentem nosso novo projeto:

No mapa ao lado temos uma noção das linhas fragmentadas do final do século XIX. A mais longa delas na direita (jusante para montante) do Jacuí tinha sua extremidade oriental nas imediações de General Câmara. Em paralelo se percebe um prolongamento do lado sul indo até Minas. Este prolongamento era necessário porque somente do lado esquerdo do rio estavam as jazidas de carvão.

Procurando um centro comercial para adquirir as provisões para os dias seguintes nos deparamos com uma exposição de fotografias no saguão de entrada. Anotamos o nome do idealizador: Claudio Rollo Rollo, historiador natural de São Jerônimo. Ele se tornou fonte importante na interpretação da história local.

A linha férrea da região carbonífera iniciava em Minas do Leão, mais precisamente nas jazidas superficiais do Recreio e Coréia. Sob o asfalto da 290, imperceptível por quem passa de veículo, está uma abertura em forma de viaduto. Por ali passava o trem antes de sua extinção. Mas deixando São Jerônimo seguimos para General Câmara até a ponte em arco. Ali saímos da estrada, nos despedimos dos anfitriões e pela mata, na orla do rio, seguimos até a Vila do Conde, o outro extremo da linha.Dentro do perímetro fica as ruínas do trapiche.

Ali o carvão trazido nos vagões era despejado nos navios. Subentende-se que é uma construção muito antiga. Os ferros superficialmente cobertos de ferrugem, todavia com uma estrutura firme. Passeamos por cima dela sem medo de que algo viesse a ruir. A terraplanagem anterior ao trapiche também está com suas características preservadas. 

Sobre a desativação de todo o complexo, que no seu auge envolveu também a cidade de Minas dos Ratos, Butiá e Charqueadas, temos que retroceder à década de 60 do século
XX quando as locomotivas Maria Fumaça foram substituídas por novos modelos a Diesel. Tudo foi desmantelado. O ferro reaproveitado e os dormentes pegos pelos próprios moradores locais para lenha. (Texto em Construção)

Fontes consultadas:

SILVA, C. E. Nas profundezas da terra: um estudo sobre a região carbonífera do Rio Grande do Sul (1883 – 1945). 2007. 391 fl. Tese (Doutorado em História) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.